quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Vingança em Cena - 2º Ato

Às 18h Nestor preparava-se para sair da sua empresa. Estava guardando seus papéis em uma pasta de couro marrom. No escritório, só ele e um faxineiro que acabara de entrar.

- Já estou saindo, termine de limpar rápido e vá arranjar outra coisa para fazer.
- Sim,senhor - disse o faxineiro que estava de costas para Nestor.

“Esses empregados babacas...” murmurou Nestor fazendo uma careta esdrúxula. O vil empresário abaixou-se para pegar um documento;olhou para a esquerda, olhou para a janela e,por fim, olhou para o reflexo. Ficou sem ar, não acreditava no que via; o faxineiro vinha na direção dele e usava uma máscara alegre, daquelas de teatro. Espantou-se e virou a fronte na direção do mascarado, uma nova surpresa; a máscara agora era de uma tristeza que beirava a raiva.

- Que..quem é você? - gaguejou Nestor.

- Quem sou eu? Eu sou o anjo caído, o filho amado, a sombra sinistra e o namorado apaixonado, ou melhor, o fantasma que mora o teatro.

- Mas...mas... Todos morreram, como pode.

- Já disse, sou um fantasma. Mas chega de conversa, o show começa e termina agora.

Antes que Nestor ousasse pronunciar outra palavra, o fantasma mascarado esfaqueou-o várias vezes. O corpo ensanguentado do empresário jazia no carpete azul; uma cena que não é para estômagos fracos, sem dúvidas.

Na manhã seguinte,sábado, o jornal informaria que o empresário Nestor Figueira morreu de ataque cardíaco na noite passada. Mais mentiras; bom, tinha um fundo de verdade. Maicon e João sabiam o que tinha acontecido; Nestor havia morrido esfaqueado, por uma figura desconhecida, um “anônimo”.

Os capangas de João e a polícia estavam trabalhando duro para encontrar o assassino;João e Maicon,cagados. Mesmo assim, Maicon decidiu seguir a agenda e discursar na praça no Domingo.

O discurso contaria com um forte esquema de segurança.João e seu bando inclusive se instalariam num casarão abandonado, localizado logo atrás do palanque. A polícia estaria espalhada pela multidão. Dois dos melhores homens de João seriam os guarda-costas do prefeito.

O espetáculo era questão de tempo: o palco estava armado e haveria uma grande platéia. O fantasma mascarado preparava-se;seria o seu maior público e a sua melhor apresentação.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Poesias Capengas, talvez.

Ainda não sei o que é isso; algumas poesias capengas,talvez.



Impar

Fui dragado pelo meu inverno;
Andei em círculos na neve,
Faminto e sem esperança,
Não pude lutar, nem fugir.
A noite caiu, e com ela eu também.

Purgatório

Eu nada mais queria
Senão contemplá-la
Em minha solidão.
Ó anjo diabólico
Que se fez maldição.

Eu nunca iria tê-la
Senão em sonhos torpes
Que dois corpos são um só.
Ó anjo diabólico
Que me fez perdição.

Eu jamais a veria
Senão em minhas febres
De poeta e pateta.
Ó anjo diabólico
Que arde com sua boca.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Vingança em Cena - 1° Ato

Máscaras Do Teatro (comédia Da Tragédia)

Aconteceu em alguma ilha remota...

A noite ostentava uma bela lua cheia e a brisa morna acrescentava um toque mágico. Aquela noite seria um marco para a sociedade da ilha; a multidão se aglomerava em torno do teatro. A companhia teatral preparou algo especial, que perturbaria os poderosos e daria fim ao longo silêncio. A ilha era controlada por três homens inescrupulosos:

O rico empresário, Nestor Figueira, mantinha o domínio - direto e indireto - de todos os estabelecimentos comerciais,industriais e imobiliários da ilha. Os preços eram, absurdamente, altos e devoravam o mísero salário dos trabalhadores. Era um homem baixo, franzino, de óculos e com 57 anos. Posava de devoto fervoroso, mas não tinha remorso no tratamento desumano para com seus inquilinos e empregados. Casas caras de péssima qualidade, remuneração miserável e nenhum segurança no trabalho; e assim, ele ia poupando dinheiro e arruinando vidas.
O chefe do crime, João Meira, era o responsável por todo tipo de serviço sujo: prostituição,estupros,tráfico,assaltos e violência gratuita ou encomendada. Despertava medo e nojo em todos, ninguém levantava a voz para ele. Era um homem robusto -entenda-se por gordo-, com 40 anos, de uma cara debochada e um olhar ameaçador. Nestor e Maicon tinham sempre um serviçinho para João; que ele fazia com prazer.

O prefeito, Maicon Dhab, possuía o “dom” da politicagem. Condenava a violência e a corrupção nos seus discursos enérgicos; embora ele praticasse ambos - vai entender. Ganhava muito dinheiro por fora. Semanalmente, discursava na praça e, no final do seu falatório, o povo brandia a mão; após singelo incentivo do pessoal do João. Quem não brandisse ou comparecesse, simplesmente, desapareciam do mapa. A polícia e a imprensa estavam minadas pela influência de Maicon.

Ninguém ousava criticar esse tripé do poder, mas aquela noite foi atípica. O enorme e rústico teatro abrigou quase toda a população da ilha, incluindo os três poderosos. Foi uma bomba, o roteiro satirizava os meios de poder daquele tripé; insinuaram a hipocrisia da religião de Nestor, dos discursos de Maicon e, por fim, ironizaram a covardia de João, que só atacava com bandos armados. Gargalhadas tomaram o espaço, enquanto os poderosos se contorciam nos seus acentos. Uma cena foi estupenda, os três brincavam numa casa de bonecas, decidindo qual as roupas dos brinquedos e quem merecia viver; não passavam de um bando de mimados.

O espetáculo foi interrompido antes do término. O grupo de João, todos armados, mandaram que o público saísse, o que não demorou, apesar do teatro ter só uma saída. O espaço ficou quase deserto, Maicon apontou o dedo para o elenco e balançou o braço freneticamente, comprimindo todos os músculos da face. As conseqüência seriam terríveis.

Na noite seguinte, o teatro era uma enorme pira. O incêndio foi acidental segundo a perícia e, posteriormente, a imprensa. Mentira. João e seu grupo, a mando de Nestor e Maicon, colocaram fogo na estrutura. “Ninguém tinha escapado, o fogo consumiu todos” afirmava o laudo. Estavam enganados, um jovem conseguiu ultrapassar a saída, antes que o forro cedesse e interditasse a passagem. Quem era ele?

Dois dias depois do desastre, um rapaz aproximou-se dos escombros, ajoelhou-se e recolheu a metade queimada de uma máscara feliz.

- Juro, os responsáveis pela morte da minha Dora, da minha família e dos meus amigos, pagarão com a vida - duas lágrimas correram.

Olhou ao seu redor.

- As pessoas merecem algo melhor do que as rédeas desses três mimados.Essa será minha última peça; minha melhor peça.

Nascia um personagem de máscara ora feliz, ora triste; e Nestor seria o primeiro a presenciar sua atuação.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

As Cartas


O destino,naquele dia nublado, reservou uma série de situações curiosas. O jovem Juca Kipp teria uma surpresa naquela manhã de outono. O vento brincava com as folhas que o tempo consumiu e a chuva se aproximava. Juca vestiu o primeiro casaco ao seu alcance e foi verificar a correspondência. Muitas coisas passavam por sua mente; seu bem querer não era seu - e nunca seria - e a guerra batia na sua porta. Quando abriu a caixa de correspondências, deparou-se com duas cartas: uma era de uma pompa maldita e a outra bastante simples.

Levou as cartas para dentro de casa e, após um longo suspiro, abriu a pomposa. “Juca M. Kipp, o senhor está convocado para lutar pela tua pátria...”, Juca soube que partiria para a morte certa; a guerra, numa região remota do globo, era responsável por um número hediondo de mortes humanas. Juca Kipp já estava arrasado com a impossibilidade de fazer feliz quem gostaria, da maneira que gostaria... E agora isso? Ser o peão de um guerra baseada na incapacidade política e na ganância?

Esmagou a carta com a mão esquerda e a arremessou com violência. “- Que porra! - finalizou”. Levou as mãos à cabeça e procurou raciocinar. Após alguns minutos, olhou para a outra carta. Apanhou-a e leu o impossível. As palavras no envelope eram claras: “ De: Juca M. Kipp Para: Juca M. Kipp”. O conteúdo seria muito mais perturbador.

“Eu sou você em outra dimensão. Isso é realmente estranho, mas você deve acreditar ao verificar a grafia e saber do que eu sei:você sonha todas as noite com corvos. Não importa como essa carta chegou até você, importa que chegou. Soube que eu, em outra dimensão, estava numa situação desgraçada. Juca, na minha dimensão eu(você) estou com quem queria estar e ela está feliz ao meu lado. Tudo aconteceu perfeitamente, como planejei. Espero que tenha ajudado. ”

“Eu sabia que nós íamos conseguir, Beth; estamos juntos e felizes ”, pensou o jovem Kipp e,em seguida, foi para a junta militar.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

O Vilão Desempregado

Waldsneidson Jacques, 47 anos, era um vilão desempregado dos quadrinhos tentando a sorte no mundo real. Não estava fácil encontrar emprego; os setores da maldade,desastres,e criminalidade estavam abarrotados de gente qualificada,ou melhor,desqualificada. A idade não ajudava muito, as leis, que impedem a discriminação e garantem a igualdade de competição, eram desrespeitadas pela vilania; é, não só pela vilania.

Waldsneidson, ou Dr. W, sonhava com suas antigas façanhas. Sempre suspirava quando lembrava do “Raio da Fome“, dos assaltos à velhinhas ,dos roubos ao banco e tudo mais. Esses planos nunca davam certo, mas ele gostava mesmo assim do seu trabalho. Na vida real, a fome é problema assolador e os assaltos infinitos; Dr.W não tinha chance nesse novo mundo.

Certa vez, Dr.W estava sentado num banco de praça e reconheceu o seu arqui-inimimo, Dimi Dínamo .

- Ei! Dimi! - chamou-o.

- Dr.W? O que você faz na realidade?

- Precisava de um emprego, porque nossa revista de quadrinhos acabou, como você sabe...

- Entendo. Qual sua nova ocupação?Ou ainda continua no crime?

- Tô desempregado, as vagas de maldade e criminalidade são poucas; muita gente trabalhando nisso. Pensei em criar problemas como queimadas ou fome, mas já tem um monte também.

- Tenta outra coisa.

-É... Mas e você o que tá fazendo?

- Agora sou funcionário público. Tentei o emprego de super-heroi, mas as condições de trabalho tão horríveis; o sindicato da classe tem reclamado bastante. Ser heroi tá foda. Bons tempos em que eu sempre salvava todo mundo. Agora é difícil me salvar.

Os dois se despediram cordialmente, como velhos amigos. No dia seguinte, Waldsneidson procuraria ajudava especializada, um psicólogo talvez.

(continua...)

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Dançando com Sombras - Parte IV (Final)

Os guardas surgiam e a faca dançava, recortando sombras e se embebedando de sangue. Cinco carcereiros ao chão. Eu estava num estado de frenesi: olhos saltados, respiração ofegante e batimentos acelerados. Observava a lâmina ensangüentada, quando a porta foi aberta. Uma luz ofuscante e duas silhuetas.Após minha visão acostumar-se, percebi; Viviane e um estranho. A estranha figura aplaudiu e apontou um revólver para mim.

- Basta, você já cumpriu com o seu propósito - o homem desconhecido disse em tom autoritário.

- Hã?

-Permita que eu explique. Você é como uma cobaia de laboratório, participa de um experimento e pronto.

- Que merda é essa?! Por que estou aqui?! - Samuel gritava agonizado.

- Uma experiência sobre os sentimentos primários do homem. Você foi escolhido aleatoriamente, não pense ser especial ou perseguido. Limpamos suas memórias e te trouxemos para cá; o nosso “laboratório”.Prepare-se para dormir. Um,dois...

- Espere! O que vai fazer com ela?

- Nada, ela trabalha para mim.

Samuel olhou chocado e não proferiu nenhuma palavra.

- Você achou que tudo foi destino? A cela vizinha e tudo mais? - indagou gargalhando.

- Isso é mentira! Como sabiam que eu olharia para ela na fila e conversaria por aquele maldito buraco?!

- Nem tudo é planejado. Como disse, você é uma experiência, ou seja, podia dar certo ou não; o experimento foi um sucesso - falava sem esboçar arrependimento e seus olhos até brilharam ao dizer “sucesso”.

Subitamente, lembrei das últimas semanas. Das estranhas coincidências. Uma mentira, uma armação.

- Você sentiu amor,ódio,dor e,enfim, vingou-se. Não existiram outros prisioneiros ou carcereiros, não passou de uma encenação pela ciência.

Samuel ajoelhou-se. Júlio, meu chefe, aproximou-se da triste figura ajoelhada. Gargalhando, apertou o gatilho.

- Adeus, minha cobaia - Júlio afirmou tomado pelo sarcasmo.

Pensei: “Por que lutar, se eu vivi uma mentira e nem sequer tenho um passado? Não sou capaz de lembrar da minha família, meu amor é uma farsa e tornei-me um animal; para que resistir?”. Atirou no meu ombro direito, a faca caiu. Repensei: “Morrer de joelhos, pelas mãos do meu carrasco;ele vai ficar perplexo com o último resultado da sua experiência”.

- A experiência está fora de controle - os lábios de Samuel esboçaram um sorriso.

Recuperou a faca usando a mão esquerda, fincou no pé de Júlio, que revidou disparando. Não era o fim. Samuel atacou mais três vezes, perfurando o peito do oponente e fazendo a verdade jorrar. Júlio estava morto. Em seguida, Samuel desabou e fitou-me eternamente; também havia morrido. Eu o matei. Larguei meu emprego. No fundo, morri também.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Dançando com Sombras - Parte III



As manhãs passaram. As noites ficaram. A luz do dia me trazia a agonia, a treva da noite a magia. Talvez, estivéssemos apaixonados e a felicidade fosse questão de tempo; mas não. Lembro dos risos, das juras e das promessas de liberdade; apenas lembro. Restou um oco no peito, um futuro de migalhas e uma raiva profunda.

Uma luz cortou minhas pálpebras; despertei. Escutei uma movimentação estranha, a porta da minha cela foi aberta e um coro de risadas tomou o éter. As “sombras” estavam diante de mim.

- Hoje, levaremos a sua namoradinha – o maldito, então, gargalhou.

Levantei e encarei aqueles seres “sem” face. Uma mulher e um homem escoltavam Viviane para fora da cela. Eu não hesitei, investi com fúria contra os carcereiros. Tolice. Fui imobilizado. Ela estava cada vez mais longe. Gritei até ficar sem forças e Viviane me fitou desdenhosamente; nunca me esquecerei daquele olhar marejado e julgador.

- O que foi que eu fiz?

- Você mentiu para mim. Você não nos salvou – ela sentenciou.

Foi a última coisa que vi, antes de ser desacordado. Uma brisa melancólica beijou meu rosto, acordei aos poucos, apoiei a palma da mão no chão e sentei. Coloquei a mão na cabeça; sangue. “Droga” - pensei. Meu réquiem havia começado.Sussurrei uma palavra na calada daquela noite sanguinolenta: “Vingança”. Culpei as “sombras” pela minha incapacidade. Estava me transformando, a “culpa” seria minha justificativa e a vingança meu prazer. Não sabia se era por ódio ou por amor.

Seria impossível reaver o que me foi roubado: o passado, o presente, o futuro. Mas não ficaria de joelhos a espera do próximo golpe.O amor e o ódio dançariam aquela tarde. Um dos guardas entrou para inspeção de rotina, eu estava cabisbaixo,sentado num canto e encolhido. Ele estranhou e aproximou-se. Levantei o olhar e percebi um objeto reluzente na cintura dele; uma faca.Um sabor amargo na boca e uma escolha feita de ferro surgiram. Decidido, tomei a faca e cravei-a no peito do seu antigo dono; senti uma satisfação sombria e gargalhei. Saí pelos corredores a fim de encontrá-la e erradicar as "sombras".

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Dançando com Sombras - Parte II

Segui aquela triste fila. Olhei para a esquerda, e então, nos fitamos;ela era o ser mais belo que já tinha visto, seu olhar e sua boca desenhados por mim,desenhados para mim. Em seguida nossos olhares se perderam; eu entrava num pavilhão, o pavilhão ‘S”.

Cada prisioneiro foi encaminhado para uma cela; um homem,uma mulher,um homem,uma mulher e assim sucessivamente. Ela passava pela minha frente, seríamos vizinhos - ou algo equivalente naquele contexto.

Meu “dormitório” era um cubículo repulsivo, úmido e imundo. Pensei: “Que espelunca!”. Os ratos estavam melhor acomodados - sem dúvida. Minha alma ficaria podre com o tempo, tal como aquele lugar. Um prato de “comida” foi lançado por uma abertura na porta. As luzes apagaram.

Engoli, vomitei. Tateei as paredes, até que encontrei um buraco na parte inferior. Abaixei a cabeça e sussurrei algumas palavras.

- Tem alguém aí?
Três minutos se passaram. Escutei alguém chorar, vinha da direção daquela abertura.

- Tem alguém ai?!

- Oi - respondeu uma voz chorosa.
- Foi você quem olhei lá fora?

- Sim.

- Qual o seu nome?

- Viviane.
- E o seu?
- Samuel.

Não direi: “Ah! Como foi agradável, estar preso e com a cabeça perto do meu vômito; mas houve um toque sublime”. Conversamos algumas horas sobre o desespero e as dúvidas; ela também não sabia o porquê daquilo. Nos despedimos.Adormeci.

domingo, 29 de agosto de 2010

Dançando com Sombras


O meu olhar despertou incerto, e o destino mais ainda. Não sabia onde estava. Havia pouca luz naquele ambiente mórbido. Olhei para cima e enxerguei um circulo luminoso, entrecortado por grades. Levantei-me a muito custo, e tentei lembrar a causa e a circunstância daquele cárcere; sem sucesso. As paredes eram de um cinza desbotado, o chão era nu e a porta enferrujada. Andei até a porta e tentei forçá-la; foi inútil, retornei para o facho iluminado. Escutei vozes.

- Esse prisioneiro é novo, dê as boas-vindas – (gargalhadas).

A porta foi aberta. Um homem encapuzado, vestindo preto, pôs-se a me observar. Outros dois - trajados como o primeiro - entraram e arrastaram-me para fora da minha cela. Largaram-me, de bruços, no chão.

- Levante-se! – ordenou um deles.

Quando apoiei meu antebraço no piso, um chute me derrubou. Eles riam como porcos. Recebi outros chutes.

- Por quê? – falei com a voz sufocada.

Não responderam, só riram mais. Colocaram-me de pé.

- Em frente, babaca!

Andei cambaleante pelo corredor; uma lâmpada quase apagada tentava iluminar o caminho. Segui até um portão vigiado por mais daquelas figuras sombrias e, enfim, saí daquela “caverna”. O sol, escondido pelas nuvens, não mandava mais seus raios.

Olhei ao meu redor: solo de terra batida, enormes muros, duas filas de prisioneiros separadas por uma grade e as “sombras” – como batizei os carcereiros – coordenando o movimento daqueles seres enfileirados. Depois percebi, uma fila era feminina e a outra masculina.

Os prisioneiros, descalços e carecas, trajavam uma túnica bege, suja pela terra e pelo sangue. Observei minhas roupas e tateei minha cabeça; estava do mesmo jeito que os outros.Pensei: “Estou num pesadelo”. Mas descartei. “Não, a dor é real demais”, repensei. Fui levado até a minha fila. Algo sublime e maldito estava prestes a acontecer.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

A Última Esquina - Parte III (final)


João ficou de pé e contemplou o homem desmaiado. Subitamente, uma tontura tomou conta do seu corpo, a visão converteu-se em um manto nebuloso e a vida começou a esvair. Confuso, tocou a mão no peito, sentiu um líquido quente e viscoso vertendo; sim,sangue. Olhou para o alto, como se perguntasse alguma coisa, que não tinha força para falar. Andou três passos para trás, as pernas cambaleavam. Escorou-se na parede e deslizou lentamente. Nesse ínterim, a mulher saiu de uma lojinha acompanhada de um senhor. Correram desesperados para perto de João.

- Já chamamos socorro, agüenta aí cara - o senhor clamou.

- Olha moço, não sei como agradecer, mas fica vivo, por favor - a mulher disse com um nó na garganta e olhos marejados.

- E o garoto? - João perguntou em voz quase incompreensível.

- Está bem, minha esposa está cuidando dele - interveio o senhor.

Depois disso, os rostos tornaram-se formas confusas e sem sentido. A morte chegava. O tal João Guilherme queria permanecer, mas já tinha feito sua escolha; derramou uma lágrima ao pensar na família e nos amigos que deixava. O peito comprimiu-se e lançou o último sussurro. Os olhos abertos agora pairavam na imensidão.
A imprensa noticiou o fato, e por uma semana foi o grande assunto, depois caiu no esquecimento. Mas a mãe e o garoto nunca esqueceram.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Qualquer coisa, menos um poema.

Bom aí vai o meu não-poema. Qualquer coisa, menos um poema.Aproveitem; ou não.


Despedida
Não houve lamentações,
palavras suspiradas,
pensamentos confusos
ou olhares descontentes.

Não houve sensações:
que tremessem corações,
dispersassem emoções
ou remoessem correntes.

(Pausa Longa)

Quisera eu... ser isso verdade.



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