segunda-feira, 25 de julho de 2011

Agridoce

Numa praça desengonçada, escondida no meio de alguns prédios, dois velhos amigos se veriam novamente. A pracinha não fazia parte da paisagem urbana, era apenas uma fugitiva, que tentava não ser devorada pela gula do cimento. Porém, o cinza sempre avança e deixa as suas marcas. Lá, além da grama rala, havia alguns banquinhos de cimento, mesinhas de cimento e até arvorezinhas de cimento.

Um visitante solitário contemplava pensativo o novo cenário, ao passo que se lembrava de tempos mais vivos, de outrora. Esse saudosista estava sentado diante de um tabuleiro de xadrez. As peças ansiosas aguardavam as ordens, mas nada aconteceu. Pode-se ouvir os peões cochichando “e agora?”; os cavalos relinchavam impacientes; os bispos mantinham a postura conveniente aos homens da santíssima igreja; as torres permaneciam silenciosas, como cabe as torres permanecer; os reis suspiravam aliviados, enquanto as rainhas lançavam olhares vigilantes.

Alguns minutos passaram e a angústia no tabuleiro só aumentava. Entrementes, o homem baixou a cabeça, mergulhando no passado. Imerso, refez cada escolha e, novamente, percorreu o caminho que o levara até aquele momento. Tudo tão longe, porém ainda tão latente. Não demorou muito para que uma senhora, que, apesar de senhora, detinha grande beleza, sentasse no outro banco. O senhor de cabelos níveos levantou o olhar e, por um breve instante, viu o rosto de uma jovem de olhos cor de avelã. Os fios castanhos, a pele macia e o beijo que fora roubado dos dois. No entanto, aos poucos, a visão se encontrou dentro das dimensões de tempo e espaço. O castanho tornou-se branco, o macio ficou áspero, mas os brilhantes de avelã ainda cintilavam.

- Já faz tanto tempo – as palavras dela ressoaram doces e melancólicas.

- É, já faz tanto tempo – o velho disse com um ar pueril.

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